segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Luz e sentido

Há dias em que é preciso calar. Há momentos em que as palavras faltam e tudo o que fica neste interstício entre pensar e comunicar é angústia. É que as palavras de outrora se converteram em expressão morta, e calar-me é sentir o peso da insuficiência dos verbos ditos, pois a palavra verdadeira, aquela que diz de mim, só parte quando carregada por uma verdade absolutamente sentida e profunda. E o que sinto, agora? Esta pergunta paira por todo o meu corpo buscando uma resposta precisa, mas que não encontra vocábulo correspondente para uma pronúncia sem hesitação. Sei apenas que algo aconteceu e que dizer qualquer palavra agora é precipitar a pronúncia de algo incerto, balbuciar sensações imprecisas e gerar terror àqueles que ouvirem uma sentença incerta. Sim, porque o risco de dizer é presente em tudo o que ouso pronunciar. E meu medo está no perigo presente em definir, marcar posição. Minha palavra agora é nômade e não encontra forma, nem conteúdo, apenas inquieta pela impossibilidade de ser pronunciada plenamente. É como se fosse dita aos poucos, na forma de sílabas soltas no meio de frases vulgares pronunciadas ao longo de um dia inteiro. E se alguém quiser me ouvir, deixo claro desde já a necessidade de atenção a retalhos que não se ligam em instantes contínuos. São frases que, ao invés de evidenciar, escondem o que carregam e montam um quebra-cabeças que nunca se completa. Isto não faria sentido algum, não fosse minha necessidade iminente de expressar o que se passa comigo e que já não sei mais como chamar. Expressar, porém, pode significar deixar guardado o mistério do que é dito. Sei que tudo o que digo carrega mistério, mas em dias como hoje é o mistério que carrega meu dizer e a sílabas intercaladas do meu retalho de vocábulos nada mais são do que um silêncio que re-vela e, portanto, guarda velado de novo o que se tentou dizer com tantas palavras antes. Descubro, então, que dizer pode ser querer guardar o que a palavra insiste em tornar claro. O problema é que a luz emitida pela palavra produz sombra no que se tenta iluminar e é penoso, embora esclarecedor, admitir a lucidez que há na escuridão.